Mais da metade dos moradores de uma comunidade periférica de Vitória (ES) considera que a responsabilidade por verificar informações é individual. Ao mesmo tempo, redes sociais são vistas com desconfiança, segundo levantamento do projeto Tecnologia e Desinformação no Território do Bem. Apesar da percepção popular, o papel das big techs na disseminação de desinformação e das fake news já está em pauta e a regulação das redes sociais segue em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF).
A pesquisa mostra que 55,22% dos entrevistados afirmam ser responsabilidade pessoal checar se uma informação é verdadeira antes de compartilhá-la e apenas 14,85% atribuem às redes sociais parcela da disseminação de conteúdos falsos. Apesar disso, apenas 20,77% dos entrevistados dizem checar as informações que recebem por esses meios.
“Eles entendem a influência das plataformas, e acreditam que por ter essa influência, um algoritmo que é um tanto quanto automatizado, elas [as redes] têm um certo dever nesse combate. Mas entendem, principalmente, que as pessoas têm, no final das contas, o poder de decisão. Se quer ou não participar, consumir, compartilhar a informação”, afirma o pesquisador e coordenador do estudo David Nemer.
O levantamento foi realizado em seis bairros da região central da capital capixaba, denominada, pelos próprios moradores, como Território do Bem. A desconfiança em relação às plataformas digitais foi mencionada por 90,57% dos entrevistados, que apontam que as redes “promovem desinformação” e as chamadas fake news.
Segundo Nemer, o domínio de redes pertencentes à Meta amplia o poder de coleta e análise de dados, especialmente em comunidades com menor acesso à informação sobre o funcionamento dessas plataformas. “Eu acredito que esse monopólio não é benéfico. Dá muito poder à Meta porque essa população está o tempo todo produzindo dados, seja no WhatsApp, através dos metadados, seja no Instagram ou no Facebook”, afirma.
O pesquisador alerta que o debate de medidas regulatórias impactam de forma desigual diferentes segmentos da população, com efeitos mais severos para moradores de comunidades periféricas. “A [não] regulação em qualquer âmbito afeta mais as populações de favelas, marginalizadas, justamente por elas não poderem contar com uma infraestrutura, tanto privada, quanto do Estado para apoiá-los em momentos de crise”, afirma.
Regulação das plataformas e o combate às fake news
O STF julga a responsabilização das big techs por conteúdos divulgados, mas o julgamento foi suspenso após pedido de vista do ministro André Mendonça, em dezembro de 2024. Até o momento, os ministros Dias Toffoli e Luiz Fux votaram para ampliar as hipóteses de responsabilização das plataformas digitais.
Em janeiro deste ano, Mark Zuckerberg anunciou mudanças nas redes da Meta, iniciadas nos Estados Unidos. Entre elas, a substituição da checagem de conteúdo por notas de comunidade — formato semelhante ao adotado pela plataforma X. As alterações foram apresentadas como resposta a críticas de que verificadores “estariam agindo de forma parcial”.
Uma das coordenadoras da pesquisa, Mirella Bravo, aponta que uma das dificuldades da regulação das redes está na própria definição do que é desinformação. A coleta de dados do levantamento foi realizada entre dezembro de 2023 e fevereiro de 2024, período em que os algoritmos das plataformas ainda apresentavam conteúdo verificado em destaque.
“Foi feita em uma época em que o algoritmo dava importância para as notícias produzidas por jornal. Isso mudou. O algoritmo mudou, né? Então, quer dizer, a entrega [de desinformação] está mais facilitada. Na época ainda tinha essa preocupação de dar destaque ao que era notícia vinda de um jornal, com produção jornalística”, diz Bravo.