Os povos tradicionais – e os peixes – da Volta Grande do Xingu, região impactada pela Usina Hidrelétrica de Belo Monte, tiveram uma vitória na Justiça, que decidiu nesta quarta-feira (12) pela manutenção de uma maior quantidade de água no trecho do rio para preservar a reprodução de espécies de peixes.
A decisão da Justiça Federal da 1ª Região derrubou uma liminar anterior, favorável à Norte Energia. A concessionária que opera a usina havia pedido autorização para reduzir o fluxo de água liberado para a Volta Grande do Xingu, trecho de cerca de 130 quilômetros do rio, entre a cidade de Altamira e a casa de força principal de Belo Monte, no Pará.
Tudo começou no final de janeiro, quando uma tempestade derrubou cinco torres de transmissão ligadas à usina. Sem a possibilidade de escoar a energia produzida, a Norte Energia se viu obrigada a diminuir a geração de energia, o que, por sua vez, provocou um aumento da vazão (volume de água que corre por determinado trecho) para a Volta Grande do Xingu, região de alta biodiversidade e lar de indígenas e ribeirinhos.
Vista da Usina de Belo Monte com o reservatório do rio Xingu ao fundo
A maior quantidade de água inundou áreas de mata onde diferentes espécies de peixes costumam desovar nesta época do ano, as piracemas. O processo, porém, foi bastante afetado desde a construção da usina, que reduziu a vazão de água para o rio, como mostramos em reportagem no fim de fevereiro (leia aqui). Com a elevação súbita promovida pelo acidente, os peixes entenderam o sinal e viram a chance de depositar seus ovos.
Com o restabelecimento das torres de transmissão, o Ibama determinou, no dia 14 de fevereiro, que a Norte Energia não reduzisse a vazão de forma abrupta até o final do período de defeso (paralisação temporária da pesca para preservar as espécies, que termina no próximo dia 15).
O temor do órgão ambiental era que um rebaixamento súbito no nível do rio provocasse impactos negativos para diferentes espécies de peixes ao prejudicar a continuidade da reprodução. O principal risco apontado era o de novos episódios de perdas massivas de ovas recém-depositadas, como aconteceu em janeiro, quando uma variação abrupta na vazão fez o nível da água descer, deixando centenas de ovas no solo seco. Uma sentença de morte, porque as ovas precisam estar na água para sobreviver.
A Norte Energia entrou na Justiça contra a determinação do órgão ambiental, alegando risco à segurança energética do país e prejuízos financeiros de cerca de R$ 16 milhões por mês. No dia 19 de fevereiro, a Justiça Federal da 1ª Região deu uma decisão liminar favorável à empresa – foi essa liminar que, agora, foi derrubada.
A decisão desta quarta-feira (12) considerou que o Ibama apresentou evidências técnicas de que a redução abrupta da vazão provocaria a morte de ovas e larvas de peixes, impactando negativamente a fauna e as comunidades de povos tradicionais, indígenas e ribeirinhos, que dependem da pesca.
Além disso, a decisão aponta que a usina de Belo Monte manteve uma geração de energia em “níveis elevados e estáveis” nas últimas semanas, “sem impactos significativos na capacidade energética nacional”.
A Usina Hidrelétrica de Belo Monte funciona a fio d’água, ou seja, depende do fluxo natural do rio Xingu para gerar energia. A vazão praticada na Volta Grande do Xingu, diretamente conectada à demanda energética, já esteve no centro de outras disputas judiciais entre o Ibama e a Norte Energia e é um dos pontos sensíveis do processo de renovação da licença de operação da usina, atualmente sob análise do órgão federal. Saiba mais nesta reportagem.